domingo, 29 de janeiro de 2017

DEUS MÃE?

Nascido de uma mulher.
Gálatas 4.4

Esta imagem e seus dizeres me fascinam. Eu gostaria de compartilhar algumas ponderações que eles sugerem. Uns podem achá-las muito fora enquanto outros podem abraçá-las.

Nos meus primeiros anos como cristão professo eu fui doutrinado para crer que a natureza foi corrompida pelo que aconteceu no Jardim do Éden, que o conhecimento humano é suspeito e que a única fonte segura de verdade é a bíblia porque é a infalível Palavra de Deus. No entanto, a experiência de muitos anos ensinou-me que a verdade é o contrário. As escrituras foram editadas e modificadas tantas vezes ao longo da história que não podem ser qualificadas como autênticas. A natureza deixou gravados muitos detalhes do nosso passado e pode nos ensinar muito. O nosso problema está em saber como fazer as leituras e entender a sua linguagem. Parece que as pessoas pré-históricas sabiam fazer estas leituras melhor do que nós.

Dentro da nossa tradição patriarcal os antigos pensavam em Deus como sendo o Ser Supremo Masculino e o criador de todas as coisas. Ele estava acima de tudo e separado da criação. As coisas materiais (incluindo os seres vivos) eram objetos inferiores e sujeitos a sua manipulação. O conceito era dualista, dividindo a realidade entre o espiritual e o material.

Os deuses masculinos são uma novidade recente na longa história de mais de dois milhões de anos do ser humano. Eles apareceram apenas a cerca de seis mil anos atrás, junto com o advento da dominação masculina do patriarcalismo. Antes disso as sociedades eram matricêntricas. Nas mitologias mais antigas a Grande Deusa Mãe deu à luz a terra e os céus. Tudo era gerado pelo corpo da deusa. Deuses criadores ainda não existiam. A maternidade era sagrada, porque somente as mulheres podiam produzir vida por meio da ação das deusas nelas. O conceito da paternidade ainda era desconhecido. Nada na natureza era “coisificado” porque tudo tinha a essência da Grande Mãe. O universo era visto como uma grande família com tudo inter-relacionado. A essência da vida era viver em harmonia com tudo e com todos, o que é contrário à nossa cultura, onde o domínio é a marca do sucesso.

À luz das descobertas da ciência e das pesquisas durante os últimos cem anos, acredito que as antigas culturas 1ginecéntricas, com suas deusas que enfatizavam a solidariedade (paz e felicidade), foram muito mais perto da verdade do que o nosso atual cultura 2androcéntrica com seu deus que coloca o domínio (ordem e progresso) acima de tudo.

As culturas ginecéntricas das deusas percebiam o universo como sendo dinâmico, vivo e auto organizado. O ecologista e ambientalista James Lovelock cunhou o termo 3"hipótese Gaia" para descrever a Terra como um grande organismo vivo. As culturas ginecéntricas consideravam que tudo era sagrado e digno de cuidado e respeito. Em contraste, a cultura androcéntrica trata do universo como sendo um mero objeto a ser manipulado, organizado e dominado. Sua filosofia é que a Terra existe para nosso benefício, e, sendo o ser humano o centro de tudo, somos justificados em tirar tudo possível.

O nosso "Deus" androcéntrico exige ser adorado e obedecido. Ele é absoluto e pode ficar muito zangada quando desagradado. Em contraste, a divindade ginecéntrica merecia ser amada, respeitada e curtida como nossa mãe. Ela nos dava à luz e ela nos recebia novamente em seu ventre quando morríamos.

Com o imperador romano Constantino (batizado no leito da morte), a igreja tornou-se androcéntrica e chegou a apoiar os governos e sociedades androcéntricos ao longo da sua história. Como o resultado de tratar o universo como uma coisa e a natureza como algo a ser dominada e explorada a terra tornou-se devastada por guerras, poluição, superpopulação e desastres ecológicos. Nossa estrutura androcéntrica está levando a humanidade em direção à autodestruição.

Precisamos voltar para a “casa da mãe”. Precisamos recuperar o sentido do sagrado em toda a natureza e a irmandade de todas as criaturas. É preciso lembrar que, por ter nascido do universo, somos suas filhas e seus filhos e devemos tratá-lo como nossa mãe.

Voltando à frase bíblica escrita do início do texto, ser nascido de mulher é uma experiência universal. Gostaria de estender o termo "mulher" para incluir todo o universo, que é basicamente feminino, porque ele é o útero de todos nós.

1GINECÉNTRICO: (do grego, gyno = "mulher " ou "feminino") dominado por ou enfatizando interesses femininos ou um ponto de vista feminino. A mesma raiz de ginecologia.

2ANDROCÉNTRICO: (grego, andro = "o homem, macho “) dominado por ou enfatizando interesses masculinos ou um ponto de vista masculino.

3O termo "GAIA" vem da mitologia grega, onde é o nome da Deusa da Terra. No final dos anos 1960, o ecologista e ambientalista James Lovelock usou o nome em sua hipótese Gaia, que postula que a Terra é um super organismo. Esta teoria ganhou muito apoio no movimento ambientalista.


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